quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Dia das Bruxas

A esta hora estaríamos a caminho de Lisboa, depois de um jantar de quinhentos escudos na tasca aqui do sítio, já regados com vinho branco da casa.
Chegados a Lisboa, encontraríamos o quarto elemento dos Cavaleiros do Apocalipse que se riria pelo facto das meninas estarem com uma maquilhagem especial e com uma vassoura minúscula da autoria do pai da L.
A ronda começaria no Gingão com uma ou duas Ginjas, passaríamos pelo Cena de Copos onde atestaríamos um ou dois B'52 e iríamos de seguida ao Keops enfrascar um Afrodisíaco Alentejano ou um TGV, isto sem deixar de passar pela tasca em frente ao Frágil para beber um Pontapé na C_n_.
Finalmente, o destino seria a Rua Poiares de São Bento.
Pararíamos no passeio em cima do número 69, abraçar-nos-íamos e simularíamos uma espécie de orgasmo coletivo e depois era descer até ao Incógnito, onde o Rai já estaria à espera da nossa loucura. Seguir-se-iam as Batidas de Coco, as Vodkas ou Mezcal ou Absinto, o que fosse, músicas pedidas, risos e muita alegria.
(A esponja do nosso estômago aguentava tudo sem fraquejar.)
No final, ou melhor, no início da manhã, esperar-nos-ia aquela tremenda subida até ao Rossio para apanhar o primeiro comboio e rezar para que quando metesse a chave na fechadura da porta de casa, o meu pai não tivesse colocado o alarme, ou, se ele o tivesse feito, desempenhar o papel de ladrão XPTO que tendo uma chave do alarme consigo, conseguia através de um espaço minúsculo colocar a chave na ranhura e dar a volta sem que o apito soasse.


Que saudades...



terça-feira, 30 de outubro de 2012

Odeio




Avestruzes.

...

Quando os vazios se preenchem com nada, a nuvem negra já nem consegue trovejar.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

A boa da pipoca






Quando era menina, comia a "pipoca do pézinho (é uma velha história que não vou contar hoje, talvez nunca conte!...)...

Hoje, é a boa da pipoca que me mantém acordada para corrigir testes. Faço uma tigela imensa e assim que elas acabam é ver a canetinha vermelha a deslizar e eu a adormecer!

Oh vida desgraçada!

É lógico que nem me atrevo a pesar antes da época dos testes e depois da época dos testes. Qualquer dia estou ainda mais lontra.

domingo, 21 de outubro de 2012

Sushi

Pela segunda vez na vida fui comer sushi no Samurai - Parque das Nações.

Estou rendida!

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

A inveja

é mesmo uma coisa horrível.



Podem parar, por favor?

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Fim anunciado

Dentro em breve, não passarei de um mito. Fechar esta porta, inevitavelmente, far-me-á fechar a minha porta.





Fico tão triste...





Não queria ser apenas um nome que flutua no meio, um mito que já foi. Queria existir ainda.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Consulta dos 3 anos

Relatório:
I. - peso - 15,5kg; altura - 1 metro; percentis 90.
S. - peso - 15kg; altura - 96 cm; percentis 65.

Notas:
A I. deveria ter uma consulta de terapia da fala, a fim de despistar alguns erros recorrentes que comete.
A S. deveria ter uma consulta de psicologia, já que a sua impulsividade/irritabilidade deve ser regulada, mesmo por que pode ser um reflexo de baixa autoestima.

Observações de mãe:
Quanto aos percentis, nada a declarar, faz-se o que se pode.
No que concerne às consultas de especialidade, não me surpreendem. Há uns tempos que ando a dizer que a I. devia ter terapia da fala, pois a inexistência fonética do [k] e a substituição (por vezes quase impercetível) do [g] pelo [d] sempre me preocuparam. No que diz respeito à S., também sempre considerei que os níveis de concentração são baixos e que a frustração face à dificuldade de realizar a tarefa (ou mesmo a incapacidade de realização) bem como as birras de irritabilidade sucessivas, que lhe causam uma baixa autoestima, são prognóstico futuro de uma das novas "doenças-em-voga". Naturalmente, este é/deve ser uma dos problemas típicos dos gémeos - a competição e a frustração por ver o outro conseguir fazer algo e ser elogiado por isso, têm impactos que podem ser devastadores.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Hoje

Quando éramos pequenos, o nosso dia de aniversário era especial. Andávamos 364 dias à espera daquele dia e quando ele chegava, a alegria contagiava-nos, fazíamos coisas diferentes, vestíamos uma roupinha nova, ninguém nos podia chatear, enfim, era como se naquele dia fossemos obrigados a ser felizes.
Com o tempo desobrigamo-nos a ser felizes neste dia e os 365 dias passam a ser iguais. Sim, os 365 dias, porque também as outras datas em que obrigatoriamente estaríamos felizes, acabam por ter o mesmo destino que o dia do nosso aniversário.
Hoje, relembro, essencialmente, aquele período, supostamente, inocente em que nos juntávamos lá em casa e fazíamos do quarto uma discoteca com slows incluídos. Lembro-me de o pôr debaixo do braço e dançar muito agarradinha a ele. Era o meu primeiro amor e este dia marcava sempre o recomeço ou a consumação do nosso namoro. Depois existiam os bolos, as sandes, os sumos, o champanhe aberto por nós, mas bebido apenas pelos adultos.
Esse tempo ficou lá atrás.
Agora obrigamo-nos a ter um jantar fora ou melhor, mas mais pelos outros do que por nós e somente para que o dia não seja mesmo igual a todos os outros. Se antes queríamos ter mais um ano e alegravamo-nos por isso, hoje irrita-nos o facto de termos mais um.

Afinal, esta fase adulta-pré-velhice incomoda.









Aniversário
Fernando Pessoa
(Álvaro de Campos)


No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas
lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais       copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...


15/10/1929