quarta-feira, 24 de março de 2010

Serra


Sempre ouvi as pessoas dizerem “Vou à terra” ou “Na minha terra” e a tristeza habitava-me nestas alturas. Eu nunca podia dizer isso, afinal vivia na terra onde tinha nascido. Uns anos mais tarde adoptei uma terra. Intitulei-a “A minha terra de coração”.

E como o meu coração por lá pairava!

Só lá ia uma vez por ano e os outros 360 dias eram vividos na ânsia de lá chegar. Toda a expectativa se centrava naquele olhar que me encadeava, toda a esperança naqueles beijos que nunca te dei. Tinha treze anos. Amei-te platonicamente durante quatro anos. Vivia das parcas palavras e olhares que trocávamos, das duas cartas que me mandaste infinitamente lidas, das ilusões que eu criava na crença de me amares também.

Sempre quis acreditar que não te era indiferente. Sempre quis acreditar que eu era especial. Talvez nunca tenha querido ver a realidade. Ainda hoje não a quero ver. Seria excessivamente penoso admitir.

Um dia chegou a notícia. Dois meses antes de eu lá ir. Deixei de comer durante dias. A tristeza e dor eram tão profundas que seria incapaz de continuar. Um trabalho de verão ceifou a tua vida e a minha. Fui viúva antes de tempo.

Hoje seria o dia do teu aniversário. 39 anos farias tu. A minha memória ainda é povoada pelos teus olhos.

Continuo a lá ir anualmente e faço questão de te visitar na tua nova morada. Foi junto à pedra fria que te confessei aquilo que sempre soubeste. Sempre fui transparente. Era demasiadamente visível o que sentia.

Inevitavelmente, hoje, lembrei-me de ti.
O passado faz parte de nós.
O passado constrói-nos.
A dor de uma perda não se esquece.

Este é o meu epitáfio para ti.

Morango

1 comentário:

RJ disse...

opá, fizeste-me chorar!
beijo querida...